Certo homem vivia no cume de uma montanha muito
alta. Por causa de um velho ferimento de guerra, ele precisava contratar alguém
para descer e subir a montanha com sua filhinha todos os dias, para que ela
pudesse ir à escola. Um número razoável de pessoas se candidatou ao emprego, e
ele fazia uma única pergunta a cada um: “A que distância da beira da montanha
você consegue chegar sem cair lá embaixo?”
Um rapaz impetuoso respondeu: “Eu consigo chegar
até trinta centímetros”.
“Isso não é nada”, disse um outro. “Eu consigo
chegar até quinze centímetros da borda do precipício”.
Um terceiro se gabou: “Eu chego até três
centímetros!”
Durante esse tempo, um homem simples permanecia de
pé, quieto no seu canto. Quando chegou sua vez, ele respondeu: “Eu não chego
perto da borda de jeito nenhum. Vou ficar no caminho seguro, porque tenho amor
à vida”.
Ele conseguiu o emprego.
Muitas pessoas acham que podem viver na beira do
precipício da corrupção espiritual e cultural. Mas essa é uma ladeira perigosa
e escorregadia para os seguidores de Cristo, pois conduz à apatia, ao pecado e
à assimilação pelo mundo. A história chocante do levita e de sua concubina (Jz
19-21) alerta o povo de Deus contra essa ameaça. O conselho para o cristão é
obedecer à Palavra de Deus e ficar firme no caminho que Ele traçou.
O Panorama da Desgraça
“Porém, os filhos de Benjamim não expulsaram os
jebuseus que habitavam em Jerusalém; antes, os jebuseus habitam com os filhos
de Benjamim em Jerusalém, até ao hoje” (Jz 1.21).
Um levita de Efraim tinha uma concubina de Belém.
As concubinas eram esposas secundárias que, geralmente, tinham um status mais
baixo dentro da estrutura conjugal. O antigo costume foi degenerando, embora
houvesse leis para restringi-lo e regulá-lo (Êx 21.7-11; Lv 19.20-22; Dt 21.10-14).
Jesus restaurou o plano original de Deus para o casamento (Mt 19.4-9). O
concubinato, a poligamia e a manutenção de uma amante são pecados (1 Co 7.2).
Aparentemente, a concubina do levita voltou para a
casa de seu pai, em Belém. Quatro meses depois, o levita resolveu buscá-la de
volta. Recebido por seu sogro conforme os típicos costumes orientais, o levita
permaneceu ali por cinco dias. Na tarde do quinto dia, ele e sua concubina
partiram de volta para casa, indo em direção a Jebus (a Jerusalém pré-israelita).
Como já era tarde, seu servo sugeriu que eles passassem a noite na cidade dos
jebuseus. Mas o levita não achou seguro pernoitarem num lugar onde não havia
israelitas. Assim, eles percorreram mais oito quilômetros até a cidade
benjamita de Gibeá. Em Gibeá, ninguém lhes deu abrigo para passarem a noite.
Essa foi uma atitude condenável dos gibeonitas, porque Deus ordenou que Seu
povo praticasse a hospitalidade (Lv 19.33-34; Lv 25.35; Mt 25.35; Hb 13.2).
Um homem idoso viu os viajantes descansando na praça
da cidade e levou-os para sua casa, para que pudessem comer alguma coisa e se
alojar até de manhã. Naquela noite, alguns homens degenerados da cidade
cercaram a casa e começaram a esmurrar a porta, gritando: “Traze cá para
fora o homem que entrou na tua casa, para que o conheçamos (abusemos dele)”
(Jz 19.22).
O velho saiu e disse: “Não, irmãos meus, não
cometais semelhante maldade; visto que o homem já entrou em minha casa, não
façais essa loucura” (v. 23). Ele chegou até a oferecer sua filha virgem e
a concubina para que os homens se satisfizessem. Mas eles não queriam mulheres.
Para livrar a própria pele, o levita empurrou sua concubina para fora.
Durante toda a noite, ela foi brutalmente
estuprada. Ao ser solta pela manhã, ela desmaiou na porta da casa. Quando seu
marido abriu a porta para sair, viu-a caída de bruços, com as mãos na soleira
da porta. Sem qualquer compaixão, ele lhe disse: “Levanta-te, e vamo-nos”
(v. 28). Mas não houve resposta. Ela estava morta.
A insensibilidade do levita para com sua concubina
ilustra, infelizmente, alguns aspectos da sociedade moderna. A Bíblia afirma
que, nos últimos dias, o afeto natural se tornará escasso (2 Tm 3.1-5).
Lamentavelmente, é isso que acontece em muitos casamentos de hoje. Nem mesmo a
família da fé está imune a isso.
Então, o levita amarrou no seu jumento o corpo sem
vida da mulher e continuou a viagem. Chegando em casa, ele cortou o corpo dela
em doze pedaços e enviou um a cada tribo de Israel. Revoltadas com aquela
visão, as tribos de Israel exigiram justiça para o crime de Gibeá (v. 30).
Foi convocada uma assembléia em Mispa, no
território de Benjamim. Ali, o levita contou aos líderes o que tinha
acontecido, distorcendo um pouco a história em seu próprio benefício. O que
disse era verdade, mas ele não mencionou a crueldade com que empurrou sua
concubina para as mãos do bando. Os anciãos exigiram que os benjamitas
entregassem os agressores de Gibeá para que fossem punidos. Mas os filhos de
Benjamim se recusaram. Sua tolerância para com a depravação tinha se
transformado numa atitude de autodefesa alimentada pelo orgulho, e essa foi a
sua ruína. “Da soberba só resulta a contenda, mas com os que se aconselham
se acha a sabedoria” (Pv 13.10).
Cega de raiva e irredutível em sua teimosia, a
tribo se reuniu em Gibeá para lutar contra seus irmãos. Sessenta e cinco mil
homens, incluindo vinte e cinco mil benjamitas, morreram em três grandes
batalhas que quase aniquilaram a tribo de Benjamim. Somente 600 sobreviveram,
escondendo-se durante quatro meses no deserto.
Mas agora havia um novo problema. As outras tribos
de Israel tinham jurado em Mispa que nunca deixariam suas filhas se casarem com
um benjamita. Depois, porém, ficaram preocupadas com a possível extinção de
toda uma tribo de Israel. Os israelitas choraram amargamente diante do Senhor
(Jz 21.2,6). Então, elaboraram um plano: eles encontraram uma cidade,
Jabes-Gileade, que não tinha participado da guerra e a castigaram, matando
todos os seus homens e mulheres, exceto suas 400 virgens, que foram capturadas
e entregues como esposas aos homens de Benjamim.
Mas ainda faltavam 200 virgens. Os anciãos de
Israel entraram em conluio e disseram aos benjamitas restantes que se
escondessem nas vinhas de Siló. Quando as filhas de Siló saíssem para dançar na
festa anual, cada homem deveria sair de seu esconderijo e raptar uma esposa
para si. Os anciãos prometeram acalmar a ira dos pais e das famílias das moças.
A Bíblia encerra esse triste episódio com estas
palavras melancólicas: “Naqueles dias, não havia rei em Israel; cada um
fazia o que achava mais reto” (v. 25).
A Única Solução
Antes de morrer, Josué alertou os israelitas para
que obedecessem ao Senhor. Ele recordou-lhes as vitórias do Senhor sobre seus
inimigos (Js 23), recapitulou a fidelidade e a bondade de Deus (Js 24) e
advertiu-os para que dessem ouvidos ao Senhor, sempre fossem fiéis a Javé e não
se associassem com os pagãos.
Entretanto, “foi também congregada a seus pais
toda aquela geração; e outra geração após eles se levantou, que não conhecia o
Senhor, nem tampouco as obras que fizera a Israel. Então, fizeram os filhos de
Israel o que era mau perante o Senhor; pois serviram aos baalins. Deixaram o
Senhor, Deus de seus pais, que os tirara da terra do Egito, e foram-se após
outros deuses, dentre os deuses das gentes que havia ao redor deles, e os
adoraram, e provocaram o Senhor à ira” (Jz 2.10-12).
O levita não achou uma boa idéia passar a noite em
Jebus. Por quê? A cidade pertencia aos cananeus. Ele sentiu que seria melhor
ficar em Gibeá. O que ele não sabia é que Gibeá tinha se “canaanizado”.
A assustadora história do levita e de sua concubina
é um retrato vívido da degradação. Israel decaiu espiritualmente porque
misturou os ritos idólatras dos cananeus com o culto ao Senhor. Os israelitas
decaíram como nação porque negligenciaram a guerra permanente contra os
cananeus. A cidade dos jebuseus deveria ter sido conquistada. Sua existência
permitiu que a traiçoeira cultura cananéia se espalhasse. Além disso,
tornando-se prisioneiros dessa cultura, Gibeá e os benjamitas perderam a visão
de Deus.
A morte de Josué e dos outros líderes daquela época
deixou um vazio na liderança espiritual da nação. É evidente que a falta de
líderes tementes a Deus leva a sociedade a fazer o que há de pior. O rei Davi
declarou: “Socorro, Senhor! Porque já não há homens piedosos; desaparecem
os fiéis entre os filhos dos homens” (Sl 12.1). Os crentes deveriam
influenciar a sociedade através de sua separação e comportamento santo. “Porquanto
a graça de Deus se manifestou salvadora a todos os homens, educando-nos para
que, renegadas a impiedade e as paixões mundanas, vivamos, no presente século,
sensata, justa e piedosamente” (Tt 2.11-12).
O caminho escorregadio que conduz à apatia, ao pecado e à identificação com o mundo é real. O grau em que as pessoas se deixam escravizar pela cultura mundana pode variar, mas a batalha sem tréguas entre o Evangelho e os valores e comportamentos do mundo é universal. “Mas revesti-vos do Senhor Jesus Cristo e nada disponhais para a carne no tocante às suas concupiscências” (Rm 13.14).
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